sexta-feira, 22 de abril de 2011

Série "Entrevista": Silvio Sarmento - I

Em sua saga por uma investigação sobre a história do teatro alagoano, o Contando a Cena traz uma entrevista com um dos atores mais talentosos do Estado, com uma vastíssima história de cena, com idas e vindas pelos palcos caetés, Silvinho, como é mais conhecido pelos amigos, nos conta um pouco da sua trajetória teatral e consequentemente da trajetória do teatro alagoano. Agradecemos carinhosamente sua generosidade e atenção.



CONTANDO A CENA - Quando e como você começou a fazer teatro aqui em Alagoas?
SILVIO SARMENTO - Comecei quando tomei conhecimento da existência de um curso de formação de atores, no caso, o da UFAL, em 1992. Eu tinha 19 anos na época, e já estava quase enlouquecendo para entrar no teatro, acho que desde os 13 anos... Vivia representando dentro de casa, feito um maluco. 

CONTANDO A CENA - Que grupos, artistas e espetáculos se destacavam naquele período? E por que?
SILVIO SARMENTO - Olha, no começo, eu não tinha muita noção de nada... Só depois, quando entrei no curso é que tomei conhecimento das pessoas que atuavam e dos grupos teatrais. Eram poucos... Sabia da ATA, do Infinito Enquanto Truque, do Cena Livre. O movimento teatral era muito esporádico. Isso bem no inicio dos anos noventa, quando comecei. Não tinha nem teatro, o Deodoro estava fechado. Os grupos eram antigos, já com uma história de luta e resistência, responsáveis pela permanência e manutenção da arte teatral em Alagoas. Por isso merecem nosso respeito e admiração. 

CONTANDO A CENA - Como você percebe o caminhar da cena alagoana do início da sua carreira até hoje? 
SILVIO SARMENTO - Percebo um crescimento enorme, graças à Deus! Hoje, existem vários grupos se  formando e permanecendo, muitas pessoas interessadas em fazer teatro, em viver de teatro. O que falta é mais incentivo em todos os sentidos. Cadê as leis: municipal e estadual? 

CONTANDO A CENA - Quais seus planos para 2011? 
SILVIO SARMENTO - Vou começar a ensaiar um texto do Homero Cavalcante, estréia prevista para junho ou julho; tem Rojo, um projeto que eu amo e quero continuar, e tem o trabalho lá do CESMAC (não sei ainda o que vai ser, e minha participação depende em parte disso). Pretendo terminar de filmar a segunda metade do curta que comecei com o Pedro da Rocha. Ah, quero dar início ao meu TCC também! rsrs.

CONTANDO A CENA - Que situação, cena ou história vivenciada no início da sua trajetória teatral você não esquece? 
SILVIO SARMENTO - Sem dúvida, o meu primeiro espetáculo, O Despertar da Primavera. Acredito que tenha marcado não só a mim, como a todos que fizeram parte. Um bando de jovens, a maioria sem experiência alguma, com um baita patrocínio (uma raridade, diga-se), um diretor que adorava instigar (Glauber Teixeira), e a vontade de fazer (descobrir o teatro). Foi muito bacana. Conseguimos, pois não existia teatro disponível na época, um galpão, onde antes era um supermercado em Jaraguá e reformamos todo. Waneska Pimentel e Mônica Carvalho como produtoras... Waneska, a produtora executiva, quase enlouquece de trabalhar. Tem um episódio antológico que não posso deixar de lembrar: todos do elenco colando mais de 3000 caixas de ovos nas paredes do galpão (para melhorar a acústica). Todos passando mal com o cheiro da cola... kkkkkkkkkkk Muito bom! Tem uma matéria que saiu na época escrita por um Luiz Nogueira (até hoje eu não sei se é o Lula Nogueira artista plástico, mas acho que é) e que transcrevo aqui:

Série "Entrevista": Silvio Sarmento - II

Página B-4, domingo 01/08/93 - Gazeta de Alagoas.


Luiz Nogueira(*)


Assisti, pesaroso, ao espetáculo teatral O Despertar da Primavera. Não por conta do grupo que o apresentou, composto de jovens apaixonados pela arte teatral, mas pelas condições nas quais o fato vem acontecendo: o espaço de um supermercado falido, de nome “Balaio”, na rua Comendador Leão. Perplexo, vi um cenário (pensado pelo Ênio Lins) bem elaborado, bem iluminado, e um grupo de jovens esbanjando amor pela arte teatral. Mas vi, (ouvi, é o termo) uma condição acústica do ambiente que compromete (por vezes) a fala dos jovens atores. Sem contar as acomodações, pouco elogiáveis. O espaço dispõe de um bom estacionamento.

Mas fiquei extremamente satisfeito. E até pediria para que as pessoas prestigiassem, nas próximas apresentações, aquele grupo de jovens que lutam, titanicamente, para que a cidade ainda se lembre de que o teatro existe e é uma atividade salutar.

Mas fiquei sem entender o seguinte: porque o grupo não está realizando  as apresentações no Teatro de Arena Ségio Cardoso, recém inaugurado. No Teatro Deodoro, nem pensar: ele está abandonado desde que o meu amigo Bráulio leite se aposentou...

Tenho visto outras atividades teatrais em “espaços alternativos” ora no auditório e ora num velho circo (aos pedaços) do estacionamento, ambos na antiga Reitoria, na praça Sinimbu. O problema tem sido o mesmo: os jovens não contam com patrocínios nem acomodações que permitam a um “crítico teatral” avaliar-lhes os talentos, o que é péssimo e capaz de fazer morrer muitas vocações artísticas. Se por acaso algum patrocínio acontece é sempre abaixo das suas necessidades com vistas a um bom espetáculo, o que é terrível, desmotivador e até mesmo cruel...

De resto este é o quadro nacional no tocante ao que se chama cultura. Mesmo a educação, que é obrigatória (a cultura também o é na Constituição) conhece os seus dias mais negros, basta que se examinem as greves, os baixos salários, a não reciclagem dos professores e outras tantas heresias...

Somente a juventude desse grupo de jovens atores se arriscaria a tão dura tarefa: a de enfrentar condições adversas para nos dar uma lição de que as coisas ainda são possíveis. Felizmente eles existem. E nos transmitem uma lição inesquecível, numa fala que não está no texto da peça: “Estamos e estaremos aqui. Sempre. Mesmo com o risco de comprometermos o nosso talento, ao trabalharmos nas condições mais adversas, porque, sabemos, o nosso maior talento (nestas horas difíceis por que passa a cultura nacional) é a nossa ousadia. Ai de nós se não fôssemos ousados!...

Sinto-me jovem, outra vez, em que me pesem os anos perdidos em lutas e clamores gritados a todos os pulmões contra a insensibilidade dos governantes com relação à cultura e à arte.

Mais calmo chego a pensar: “Quem sabe essa juventude é diferente da minha e conseguirá sensibilizar os novos dirigentes da Nação?”

Mas concluo(entristecido): “Se os governantes não ouvirem o clamor e o esforço daqules jovens permaneceremos nas trevas...”